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Ele é burro, mas eu o admiro

Por Fernando Jorge

Alguém poderá dizer, após a minha confissão:


– Fernando Jorge, você emburreceu? Admira um burro? E a sua inteligência, a sua cultura? Jogou-as no lixo? Você que tem na sua biblioteca mais de dez mil dicionários sobre todos os assuntos, e que sempre lê os seus verbetes... Você que leu com imenso prazer o poema A divina comédia, de Dante Alighieri, o poema Os Lusíadas, de Luiz Vaz de Camões, o romance Dom Quixote de La Mancha, de Miguel de Cervantes, você, Fernando Jorge, depois de saborear essas obras-primas da literatura universal, você, um escritor, admitir que admira um burro! É um absurdo!


E o meu prezado leitor, indignado, acrescentará:


– Diga-me uma coisa, Fernando Jorge, fale a verdade, você sofreu um golpe na cabeça? Está com traumatismo craniano? Sim, pois se a sua cabeça não sofreu uma porrada fortíssima (redundância, toda porrada é fortíssima), você, Fernando Jorge, asseguro, não é o autor dos livros com o seu nome. Não escreveu o livro sobre o Aleijadinho, premiado pela Câmara Brasileira do Livro, as biografias de Olavo Bilac, Paulo Setúbal, Getúlio Vargas, Lutero, Barack Obama, Adolf Hitler...


Se o prezado leitor soltar tais palavras diante de mim, eu iria perguntar a ele:


– Mas por que pensa assim?


Suponho que a resposta seria esta:


– Porque você, devido ao fato de admirar um burro, é um burro chapado e burros chapados não escrevem livros. Alguém os escreveu para você, inclusive o seu último livro, o romance Eu amo os dois, cuja primeira edição já está quase esgotada.


Ouvindo tais palavras, eis qual seria a minha resposta:


– Caro amigo leitor, o burro que eu admiro e até amo é o burro no qual D. Pedro I estava montado, quando proclamou a nossa Independência em 7 de setembro de 1822, na colina do Ipiranga, de São Paulo. D. Pedro I se achava em cima de um burro e não de um cavalo, ao contrário do que mostra o famoso quadro do pintor paraibano Pedro Américo.


Concluiria a resposta com as seguintes palavras:


– Além disso estou em boa companhia, porque um escritor inteligente, Marcelo Duarte, também admira esse quadrupede. E o admira tanto que produziu um excelente livro, intitulado Memórias póstumas do burro da Independência, lançado pela editora Martins Fontes, a mesma da sétima edição da minha obra sobre o Aleijadinho.



Fernando Jorge é jornalista, escritor, dicionarista e enciclopedista brasileiro. Autor de várias obras biográficas e históricas que lhe renderam alguns prêmios como o Prêmio Jabuti de 1962. É autor do livro “Eu amo os dois”, lançado pela Editora Novo Século.

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