Amo, de modo igual, esposa e sogra
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Amo, de modo igual, esposa e sogra

Por Fernando Jorge


O meu romance autobiográfico Eu amo os dois, lançado pela editora Novo Século, está me fazendo receber cartas singulares, cheias de revelações que me surpreendem. Nessas cartas os seus autores me pedem conselhos, mas confesso, não sou autoridade em assuntos de casos de amor. Falta-me experiência, nunca fui metido a galã de telenovela, pois tenho o senso do ridículo, e embora desprovido de beleza física, as mulheres sempre me trataram com simpatia, talvez pensando assim:


– Coitado desse escritor. Ele é tão feinho, tão magrinho...


Pois é, repito, quem sou eu para bancar o mestre, o sabichão em assuntos de amor? Mas apesar dessa minha incapacidade, continuo a receber cartas que me deixam meio confuso. Os seus autores pedem para as comentar nos meus bate-papos, omitindo os seus nomes. Eis o texto de uma dessas cartas:


“Prezado escritor, a minha esposa leu o seu romance Eu amo os dois e gostou tanto dele que me aconselhou a lê-lo. Ela vê uma certa semelhança entre a sua história de amor e a nossa história. Li o romance e concordo com ela. Aliás, o amigo do senhor, Ronaldo Côrtes, fez bem em estimular o senhor a escrever esse romance autobiográfico.”


O autor da carta colocou nela algumas informações sobre a sua vida, a sua profissão, o seu passado, e após fazer isto, resolveu confessar:


“No romance Eu amo os dois existe a história verdadeira de Elza, que amava de maneira sincera o senhor e um primo dela. Elza amava dois homens. Eu amo duas mulheres, a minha esposa e a minha sogra, ambas lindas, fascinantes. E as duas também me amam, de forma idêntica.”


Esse leitor me enviou fotos das duas. De fato, são lindas, porém fisicamente desprovidas de semelhança. O meu leitor conta que, sem filhos, vive com as duas, mãe e filha. A mãe, ainda jovem, ficou viúva e ele a convidou para os três viverem juntos. E acrescenta:


“Afirmo e reafirmo, amo, de modo igual, esposa e sogra. Sou culpado, sou um tarado? Devo punir, castigar o meu coração?”


A parte da carta que mais me impressionou é esta:


“Escritor Fernando Jorge, só durmo com a minha esposa, mas ela me disse que se falecer, devo me casar com a sua mãe. Disse isto a ela, causando a seguinte resposta: minha querida filha, quero morrer antes de você, juro, mas se essa desgraça acontecer, caso-me com o seu marido, porque ele também me ama e eu também o amo.”


No fim da carta, o leitor pede a minha opinião. A única que coisa que posso dizer, confesso, é apenas isto: não tenho opinião, sou um pobre mortal, repleto de defeitos e só Deus conhece os caminhos retos ou sinuosos dos nossos humanos corações...


Fernando Jorge é jornalista, escritor, dicionarista e enciclopedista brasileiro. Autor de várias obras biográficas e históricas que lhe renderam alguns prêmios como o Prêmio Jabuti de 1962. É autor do livro “Eu amo os dois”, lançado pela Editora Novo Século.

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