Por Fernando Jorge
Já informei, num desses meus bate-papos, que o presidente Juscelino Kubitschek me convidou para escrever a sua biografia. E não me esqueço da emoção dele, ao referir-se à mãe, dona Júlia.
– A minha mãe – declarou Juscelino com os olhos úmidos – era professora do curso primário e ficou logo viúva, pois o meu pai, um caixeiro viajante, faleceu tendo apenas trinta e poucos anos. Viúva bem pobre, ela andava todos os dias mais de seis quilômetros, para dar aulas.
Duas lágrimas deslizaram pelo rosto de Juscelino e ele prosseguiu:
– Eu queria ser médico e ela, a fim de me ajudar nesse sonho, vendeu a única joia que o meu pai lhe dera, um anel de ouro com um diamante...
Mais lágrimas escorreram pelo rosto do ex-presidente. Ele perguntou:
– Você, por ser escritor, decerto conhece poesias sobre o amor materno.
– Conheço – respondi – mas há uma que é da minha preferência, da autoria do poeta francês Jean Richepin.
Repleto de curiosidade, Juscelino quis saber:
– E como é essa poesia?
Após ligeira pausa, comecei a narrar:
– Jean Richepin conta, na sua poesia, que um rapaz ficou loucamente apaixonado por uma linda e caprichosa mulher. Ela, porém, não tinha bons sentimentos e disse a ele: se você de fato me ama muito, arranque o coração de sua mãe e o traga para mim, de maneira rápida. O rapaz, enlouquecido pela sua paixão, saiu correndo, pegou um punhal e arrancou o coração de sua mãe. E com esse coração sangrando, voltou a correr e caiu, no meio do caminho. O coração da sua mãe, no solo, perguntou, aflito: você se machucou, meu filho?
Jamais me esquecerei de duas emoções, quando terminei de falar, da minha e a do Juscelino...
Fernando Jorge é jornalista, escritor, dicionarista e enciclopedista brasileiro. Autor de várias obras biográficas e históricas que lhe renderam alguns prêmios como o Prêmio Jabuti de 1962. É autor do livro “Eu amo os dois”, lançado pela Editora Novo Século.
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