Obras de Rosilene Fontes contam com instalação sonora em que o público testa sua acuidade auditiva no centro da cidade
O Centro Cultural Correios São Paulo abriu a exposição individual “Diagnóstico da Cigarra” da artista visual Rosilene Fontes. Cerca de 20 obras em exibição resgatam a experiência da perda da audição por parte da artista. São trabalhos em que Rosilene mistura relatos de outras pessoas surdas a seu próprio processo de diagnóstico, convidando o público a engajar-se na tomada de consciência de suas capacidades sensoriais e suas aspirações pessoais.
“A experiência do público, permeada pelas narrativas abertas nos trabalhos, amplia o alcance de um assunto que passa invisível e que se evidenciou de forma intensa no biênio pandêmico, quando a comunicação passou a ser velada por máscaras e a maioria das pessoas foi obrigada a conviver com seus silêncios internos”, declara a artista.
O curioso diagnóstico da cigarra que intitula a exposição faz menção ao momento quando, ainda criança, Rosilene se deu conta da dificuldade em ouvir o som desse inseto, dependendo do lado que repousasse sua cabeça ao travesseiro. A deficiência passou inaudita até que, aos 21 anos de idade, recebeu o diagnóstico de irreversível perda auditiva no ouvido esquerdo, e, no direito, depois dos 30. “Diagnóstico da Cigarra”, não à toa, é também o título da instalação sonora que emite o canto da cigarra por dois minutos a cada hora, começando com 50 decibéis, o máximo tolerável para o ouvido humano, e até ser audível apenas para quem não tem deficiência auditiva.
A participação ativa do público também se faz necessária para a plena apreensão dos relatos de pessoas surdas exibidos nas paredes do espaço expositivo, uma vez que, em letra miúda, só podem ser lidos com o auxílio de uma lupa. Assim como nas urnas, uma transparente e outra translúcida, em que Rosilene convida o visitante a depositar, escrito à mão num papel, o que cada um quer e o que não quer ouvir, numa espécie de jogo sinestésico.
Coletora de insetos, casulos, conchas e pedras, Rosilene organiza numa vitrine esses elementos simbólicos, recombinando-os com imagens de livros, desenhos, documentos e fotografias de seu acervo pessoal. A essa entrega, somam-se instalações de parede em que ela desenha insetos, ora entendidos como seres dotados de força e produtividade, sobre seus próprios exames audiométricos. Os exames, por sua vez, são instalados sobre barras de madeira, onde Rosilene inscreve expressões/xingamentos capacitistas como “bobinha” e “desligada”, os mesmos que ouvira em sua infância. “Este glossário usado para derrubar, aqui sustenta a leveza”, sustenta.
Exposição: “Diagnóstico da Cigarra”, individual da artista Rosilene Fontes Até 01/04/2022 Centro Cultural Correios São Paulo Praça Pedro Lessa, s/n – Vale do Anhangabaú, Centro, São Paulo – SP Segunda a sexta-feira, das 10h às 17h Entrada gratuita
Commenti