Por Fernando Jorge

Participei, com Heródoto Barbeiro, várias vezes, do programa do Paulo Lopes, na rádio Globo. Era de debates e Heródoto brilhava sempre, pois é um jornalista talentoso, dotado de bela cultura.
Quando eu fui diretor da Divisão Técnica de Biblioteca da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, o líder de uma bancada pediu a mim e ao Heródoto para escrever vários discursos, a fim de serem lidos, durante as sessões, pelos deputados menos providos de conhecimentos. Eu e o Heródoto então ficávamos redigindo os discursos. Um dia o Heródoto me perguntou, na sala do líder da bancada, após colocar no papel um desses textos:
– Fernando, você já foi ouvir, aqui na Assembleia, os belos discursos que nós dois estamos escrevendo?
Respondi, olhando a cara séria do Heródoto Barbeiro:
– Não, até agora não sei, juro, como eles pronunciam os nossos discursos.
E o Heródoto, vivamente:
– Vá ao plenário, Fernando, vá logo para ver como esses deputados usam os nossos textos.
Fui ouvir os discursos. Horrorizei-me. Os tais parlamentares nem sabiam ler de modo correto. Erravam sempre na pronúncia das frases, gaguejavam, atrapalhavam-se...
Voltei à sala do líder da bancada e o Heródoto quis saber:
– Gostou, Fernando?
Pela minha cara, ele obteve a resposta e apenas disse:
– Eu e você estamos dando pérolas a porcos, em vez de restos de comida.
Heródoto Barbeiro com a sua bela cultura, estava evocando as palavras da Bíblia, no Evangelho de São Mateus, margaritas ante porcos (pérolas aos porcos).

Fernando Jorge é jornalista, escritor, dicionarista e enciclopedista brasileiro. Autor de várias obras biográficas e históricas que lhe renderam alguns prêmios como o Prêmio Jabuti de 1962. É autor do livro “Eu amo os dois”, lançado pela Editora Novo Século.
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