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Cambismo no futebol: Quando a paixão se transforma em negócio ilegal

Por Roberto Maia


A final do Campeonato Paulista entre Corinthians e Palmeiras, na Neo Química Arena, expos um problema crônico no futebol brasileiro: o cambismo. Os ingressos para este esperado clássico, que deveriam ser um convite à celebração esportiva, estão sendo comercializados por valores absurdos, alcançando até R$ 1.500 em algumas plataformas.


Palmeiras implementou o reconhecimento facial no Allianz Parque em 2023 e praticamente acabou com o cambismo em jogos do time. (Foto: Fabio Menotti/Palmeiras)
Palmeiras implementou o reconhecimento facial no Allianz Parque em 2023 e praticamente acabou com o cambismo em jogos do time. (Foto: Fabio Menotti/Palmeiras)

O fenômeno ultrapassa os limites da simples revenda. Grupos de WhatsApp e perfis no Instagram transformaram a comercialização de ingressos em um mercado paralelo lucrativo. Mais grave ainda é a constatação de que até mesmo ingressos destinados a pessoas com deficiência (PCD), originalmente gratuitos, estão sendo objeto de especulação comercial.


A escala do problema é impressionante. Um ingresso do setor sul, originalmente vendido por R$ 38 no programa Fiel Torcedor estavam sendo oferecidos por R$ 1.000 - uma majoração absurda de cerca de 2.532%. Essa prática não apenas prejudica o torcedor comum, mas também viola princípios básicos de acesso ao entretenimento esportivo.


Investigações recentes revelam um esquema complexo de revenda. Sócios-torcedores, conselheiros e até funcionários do próprio clube podem estar envolvidos neste circuito ilegal. A denúncia de um ex-funcionário do departamento de tecnologia do Corinthians trouxe à tona a dimensão do problema, expondo fragilidades no sistema de distribuição de ingressos.


O Corinthians, confrontado com a situação, tem respondido com medidas que misturam tecnologia e fiscalização. O clube planeja implementar reconhecimento facial a partir de junho de 2025, uma estratégia que já demonstrou eficácia em outros clubes como Palmeiras e Athletico-PR. Além disso, está colaborando com investigações policiais e denunciando perfis irregulares nas redes sociais.


A legislação brasileira já prevê punições para cambistas. A Lei Geral do Esporte estabelece penas de reclusão de 1 a 4 anos para quem revende ingressos acima do valor original. No entanto, a aplicação prática dessas penalidades ainda encontra desafios significativos.



Final do Paulistão na Neo Química Arena fez disparar o preços dos ingressos no câmbio negro através das redes sociais. (Foto: Tino Simões)
Final do Paulistão na Neo Química Arena fez disparar o preços dos ingressos no câmbio negro através das redes sociais. (Foto: Tino Simões)

Experiências internacionais, especialmente na Europa, oferecem insights valiosos. Países como Reino Unido e Alemanha desenvolveram estratégias robustas de combate ao cambismo, incluindo legislações rigorosas, sistemas de ingressos nominais e plataformas oficiais de revenda.


O cambismo representa mais do que um problema econômico - é uma afronta à cultura esportiva. Transforma a paixão pelo futebol em uma mercadoria exclusiva, negando a milhares de torcedores o direito de acompanhar seu time em momentos históricos.


Para combater essa prática, é necessário um esforço coordenado entre clubes, autoridades, plataformas digitais e torcedores. A conscientização sobre os riscos e consequências do cambismo é tão importante quanto as medidas repressivas.


Enquanto o futebol não se tornar verdadeiramente inclusivo, com mecanismos efetivos de controle e democratização do acesso, o cambismo continuará sendo um triste capítulo de nossa cultura esportiva. A solução exige transparência, tecnologia e, sobretudo, o compromisso de todos os envolvidos em preservar a essência popular do esporte mais amado do Brasil.





Roberto Maia é jornalista e cronista esportivo. Escritor e editor do portal travelpedia.com.br


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